Que Horas Ela Volta? estreou, no fim de agosto, em apenas 91 salas e com expectativa de atingir um público de 280 mil pagantes. Agora, há cerca de três meses no circuito, os números são outros: o filme é cotado para brilhar no Oscar e já foi visto por 400 mil pessoas – digo, só nos cinemas. Isso porque a organização do longa-metragem divulgou no Facebook um balanço atualizado de 850 mil espectadores, colocando na conta quem assistiu ao drama de Anna Muylaert em sites (como no Mega Filmes HD e Filmes Online Grátis) e reproduções piratas. Mas afinal: a distribuição não oficial ajuda ou atrapalha o diretor e a obra?

Que horas ela volta? e o nosso jeitinho de ver o lugar de quem está por trás da mesa

Quem travou uma polêmica entre direitos do autor e a pirataria foi o cineasta José Padilha. Em entrevista recente à Trip, o realizador de Tropa de Elite contou que, em 2007, o então ministro da Cultura, Gilberto Gil, tinha uma cópia pirata do filme meses antes de a obra estrear nos cinemas. “Uma figura que vive da venda de direitos autorais, né? E que é ministro da Cultura!”, falou indignado Padilha, que foi pessoalmente ao gabinete de Gil e “confiscou” o DVD. O vazamento de Tropa de Elite fez com que a sequência, Tropa de Elite 2 (2010), tivesse uma equipe pequena na pós-produção e segurança maior para evitar o vazamento.

Mas essa briga seria mesmo viável? “Acredito que a pirataria é um processo irreversível e, portanto, traz uma nova relação entre os produtores, os canais de distribuição de sua obra e, claro, o público final. Neste ponto, penso que essa nova relação tem alguns pontos que o mercado começa a considerar”, diz a mestra em pirataria no ciberespaço, Cândida Nobre. “[Hoje] uma parte da indústria entendeu que seria uma luta inglória dizer ao seu público que baixar um filme ou comprá-lo em camelôs na rua era crime”. A pesquisadora considerada que essa tomada de decisão é “excelente”.

Combate_Pirataria_7714

O que é que a pirataria tem?

A facilidade em consumir vídeos através de Torrent, sistema de compartilhamento de download, é um chamariz da internet, de acordo com a estudante Maria Eduarda Ribeiro. “O benefício, primeiramente, é que o filme em si é de graça (apesar de eu pagar pela internet). E eu também consigo achar com facilidade os Torrents dos filmes. Ou seja: baixo com facilidade e rapidez, assisto com conforto e pauso na hora que quero”. Ela diz que muitos filmes que procura na web não passam nas telonas e são mais antigos, porém ela não abre mão de “assistir aos filmes em HD, com áudio bom e imagem boa”.

“Estamos diante de uma nova forma de autonomia e, neste momento, não dá para convidar as pessoas a assistirem seu filme e na outra ponta tratá-las como criminosas, especialmente porque a conduta de assistir filmes a partir de suas versões não autorizadas pode ocorrer mediante diversas motivações”, é o que pensa Cândida Nobre. A pesquisadora fala também que nem sempre contar com o circuito de filmes no cinema é justo, porque em muitas cidades do país sequer há salas. “A distribuição de alguns filmes permanece precária e confusa em algumas cidades”.

Papel da Justiça

Todo esse imbróglio, porém, não é recente. A polêmica que ganha coro agora, na internet, vem desde a criação do VHS, cuja fita magnética já criara no fim do século passado um ambiente de reprodução de cópias em massa. Esta pesquisa da Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) estuda casos de direitos autorais desde o surgimento da fotografia, no século 19, até exemplos da web e aponta: o debate jurídico não pode se manter afastado das forças políticas e econômicas, das empresas de distribuição e do próprio consumidor. Senão, é só “enxugar o gelo”.

Dentro da própria Justiça há controvérsias sobre pirataria e punições associadas a quem a banca. Apesar de a falsificação de filmes ser considerada ilegal, o juiz da cidade de Alvorada (RS) concluiu, em 2012, que era improcedente uma denúncia do Ministério Público contra um vendedor de DVDs piratas. O magistrado usou como argumento o fato de a pirataria ser comum nas cidades e aceita pela sociedade. Mas naquele mesmo ano, mais de 500 mil CDs e DVDs falsificados foram apreendidos no Brasil, segundo levantamento da Abes (Associação Brasileira das Empresas de Software).

M. F., 38, perdeu o emprego há dois anos e virou trabalhador anônimo na região central do Recife (PE). “Hoje em dia, eu vendo de 15 a 20 DVDs piratas por dia e na realidade isso quem colocou na rua foi a tecnologia. E a própria internet tira da rua, porque tem gente com acesso 24h a todo tipo de filme online”, diz. “Comprar DVD é uma fuga, é uma forma de ter acesso a esse tipo de diversão”.

Entrevista de José Padilha sobre pirataria

[authorbox authorid=”3″ title=”Sobre o Autor”]